Política

Câmara aprova texto-base de projeto que modifica lei de combate às drogas

Proposta prevê medidas como a internação involuntária de dependentes químicos e a ampliação de pena para traficantes

O autor do projeto, deputado federal Osmar Terra (PMDB-RS), durante seu discurso, mostra um saco de plástico e diz que o usuário de crack consome esta quantidade em dez dias
Foto: Ailton de Freitas / O Globo
O autor do projeto, deputado federal Osmar Terra (PMDB-RS), durante seu discurso, mostra um saco de plástico e diz que o usuário de crack consome esta quantidade em dez dias Foto: Ailton de Freitas / O Globo

BRASÍLIA —  A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira à noite o texto-base do projeto que altera a Lei de Drogas, permitindo a internação involuntária de dependentes químicos, mas desde que haja autorização da família. Um médico terá que atestar a necessidade de internação. Foi excluído do texto de autoria do deputado Osmar Terra (PMDB-RS) um trecho que permitia a agentes de segurança pública também determinar a internação.

O texto prevê ainda atuação de entidades terapêuticas, mas exige que a internação compulsória só seja feita nos estabelecimentos que prestem atendimento de saúde. Ou seja, aqueles que dão apenas atendimento religioso não podem receber pacientes internados involuntariamente.

O projeto aprovado aumenta de 5 para 8 anos de cadeia a pena mínima para o grande traficante integrante de organização criminosa. A pena máxima continua sendo de 15 anos. O texto não inclui o cadastramento de dependentes, que era previsto no primeiro texto do relator da proposta, o deputado Givaldo Carimbão (PSB-AL). Após a votação de todos os destaques no plenário da Câmara, o texto ainda será remetido ao Senado. Os destaques pedem a retirada de trechos considerados polêmicos do projeto. Foi derrubado, por exemplo, o artigo que determinava a inclusão em rótulo de bebidas alcoólicas de advertência sobre malefícios para a saúde dos consumidores. Foram 169 votos contra a advertência e 149 a favor.

Carimbão incluiu no texto, a pedido do PT, o direito a redução da pena para o traficante de “menor potencial ofensivo” — preso primário, detido com quantidade não tão grande de droga. O substitutivo, porém, não definiu qual quantidade de droga caracteriza esse tipo de traficante. Hoje, ele não tem direito às benesses da progressão de regime.

Vagas de trabalho para ex-usuários

Foi aprovado também um capítulo sobre inserção social do paciente recuperado. A proposta de Carimbão destina para a pessoa que está recebendo atendimento de drogas 3% do total de postos de trabalho em obras públicas que ofereçam mais de 30 vagas. Mas o texto prevê que o usuário deve se manter na abstinência no trabalho. Se tiver alguma recaída, perderá o emprego. O governo é contra estabelecimento desse percentual e o PT apresentou destaque para derrubar o artigo.

— Não tem sentido. Até mesmo a recaída é prevista no tratamento. Não se pode vincular estabilidade no emprego à abstinência de droga ou álcool — disse o deputado Paulo Teixeira (PT-SP).

Segundo Teixeira, o PT era contra o aumento da pena mínima para traficante vinculado a organização criminosa. Ele entende que essa medida pode gerar confusão entre quem é usuário ou traficante. O assunto seria objeto de votação em separado.

— É uma medida que vai gerar confusão. Como definir se um grupo de quatro pessoas é traficante ou não. Pode haver quatro pessoas fumando maconha e acharem que são traficantes. E vai o usuário cumprir pena maior que um homicida.

O debate foi intenso. Autor do projeto, Osmar Terra discordou de Paulo Teixeira e afirmou que o objetivo é reduzir locais de boca de fumo:

— Por mim, todo traficante, pequeno ou grande, tem que ser preso. Sem qualquer regalia.

O texto-base aprovado prevê que pessoas físicas que doarem dinheiro para instituições e organizações que atuem no tratamento de viciados poderão abater até 6% do Imposto de Renda. Mas foi apresentado um destaque para derrubar esse artigo.

Osmar Terra, durante seu discurso em favor do projeto, exibiu um saco pequeno de plástico, cheio até a metade, onde dizia ter a quantidade de crack suficiente para o consumo de cinco dias. Mas o saco continha pedaços de giz.

O plenário da Câmara rejeitou a mudança dos rótulos de bebidas alcoólicas, que deveriam conter advertências sobre o malefício de seu consumo. Porém, foi pedida votação nominal.

Internação compulsória causa polêmica

O projeto substitutivo, do deputado Givaldo Carimbão (PSB-AL) para o projeto do deputado Osmar Terra (PMDB-RS), muda o Sistema Nacional de Políticas sobre Drogas (Sisnad) para definir condições de atendimento aos usuários, diretrizes e formas de financiamento das ações.

Durante a votação, a internação involuntária de usuários de drogas, prevista no projeto, causou polêmica entre deputados. O líder do PSOL, deputado Ivan Valente (SP), disse que a medida é repressora, não vai resolver o problema do consumo e vai incentivar a família a internar antes, em vez de lidar com o problema.

— Avançamos na luta antimanicomial, em que a internação compulsória precede a análise de uma junta médica, e agora qualquer familiar, com dificuldade de lidar com a droga, vai internar involuntariamente um usuário sem saber se isso é eficiente — ironizou ao comparar à prática de manicômios.

Já o autor do projeto, deputado Osmar Terra, disse que o texto mira em usuários que estão nas ruas sem condições de se reabilitar.

— São pessoas que não têm família, dormem nas ruas, perderam tudo e não conseguem trabalhar, vivendo apenas esperando os próximos 15 minutos para usar a droga — disse.

O deputado Sirkis (PV-RJ) criticou o viés repressivo do projeto, que visa a internar usuários:

— A questão das drogas tem de passar da esfera da segurança para a saúde.

Mas o deputado Weliton Prado (PT-MG) disse que o projeto não prevê a internação, mas o acolhimento dos usuários.